3 de Abril, 6ª aula. O género documental abre, necessariamente, o espaço de reflexão — e também as interrogações — em torno da questão do
realismo & verdade. Porquê? Porque o documentário é sempre um filme que parte desta constatação básica:
já lá estava alguma coisa...A
démarche de Jean-Luc Godard integra essa questão, sistematicamente, obsessivamente, por vezes fazendo-nos ver que aquilo
que já lá estava pode ser "apenas"
uma imagem. Exemplo modelar entre todos: a curta-(curtíssima: 2 minutos)-metragem
Je Vous Salue, Sarajevo (1993), toda ela construída sobre uma fotografia, obtida em Sarajevo, e a oposição entre a
regra (a cultura) e a
excepção (a arte).

O olhar de Errol Morris parte da constatação de que
aquilo que já lá está passa também
pelo que se diz sobre o que lá está.
Vernon, Florida (1981) pode mesmo ser definido como o retrato de uma pequena cidade americana que nos chega, acima de tudo, pelas palavras de alguns dos seus habitantes: a tensão narrativa nasce do confronto entre a elaboração dessas mesmas palavras e, não poucas vezes, a irrisão daquilo que nos é mostrado, ou melhor, aquilo com que o cineasta se confronta. A verdade do filme está, talvez, na verdade dessa
coabitação de um olhar que chega e dos lugares que o recebem, do
cruzamento de uma interrogação que se formula e das palavras que, aparentemente, lhe respondem.
> Não haverá um pouco, só um pouco, de ficção em tudo isso? *
Je Vous Salue, Sarajevo (1993), de
Jean-Luc Godard
*
Vernon, Florida (1981), de
Errol Morris
***
Para a cerimónia da 79ª edição dos Oscars da
Academia de Hollywood (25 Fev.), Errol Morris realizou um pequeno filme (de pouco mais de 4 minutos) que vale a pena ver — é um exemplo de "entrevista/reportagem/documento" que integra, sem preconceitos, uma agilidade de montagem e uma alegria narrativa que temos tendência a associar
apenas àquilo que chamamos ficção.